Mais iniciativa da Chiado Editora: 'Um Livro Num Dia'
Para comemorar o Dia Mundial do Livro, 23 de Abril, esta Editora montou um 'escritório' no Jardim Vasco da Gama, em Belém, em pleno Pavilhão Princess Maha Chakri (Pavilhão Tailandês).
Ali, à vista de todos, seleccionou os contos dos autores e preparou um Livro, que às 19h distribuía.
Este foi o meu conto:
O Livro Esquecido
Desceu por aquelas escadas de
pedra, descalçou os sapatos e sentiu a areia, ainda morna, a abraçar os seus
pés.
Era uma agradável tarde de
inverno, a brisa soprava morna, mas o mar estava agitado. Tal como ela, por
baixo daquela imagem serena, batia um coração inquieto, revoltado, em
tempestade.
E era tarde. Tarde em todos os
sentidos que o tempo tem…
Trocou a areia tépida pela água
fresca e sentiu um arrepio chegar-lhe ao pescoço. Era como que um despertar da
sua letargia, do seu sono, de um longo adormecimento. Uma lágrima nasceu e
fugiu. Apanhou-a já por baixo do queixo.
Naquele momento sentiu que algo
esvoaçava aos seus pés, como que uma borboleta a agitar inúmeras asas, mas
presa ao chão…
Era um livro.
Era um livro.
Baixou-se, ajoelhou-se e pegou-lhe
com todo o cuidado. A capa descolava-se, as folhas pareciam querer voar. Estava
amarelecido, não pelo sol, mas pelo tempo. Por aquele outro tempo que tudo
leva: cor, poema, vida, dor… Não, a dor fica.
- Desculpe… - uma voz masculina vinha por trás de si. Quase que saltou.
- Esse livro é meu – continuou ele, ao mesmo tempo que lhe agarrava na mão e a ajudava a levantar-se – Ou melhor, era da minha mãe. Ela gostava muito de vir lê-lo para aqui. E hoje, que a perdi, resolvi fazer o mesmo.
- Esse livro é meu – continuou ele, ao mesmo tempo que lhe agarrava na mão e a ajudava a levantar-se – Ou melhor, era da minha mãe. Ela gostava muito de vir lê-lo para aqui. E hoje, que a perdi, resolvi fazer o mesmo.
Dos seus olhos nasceram duas
lágrimas. Mas as dele não fugiram. Passearam pelo seu rosto, deambularam lentamente
pela pouca barba, seguiram pelo pescoço, e ele nada fez para as segurar.
- Eu também perdi a minha mãe –
confessou a jovem, admirando a coragem dele – Ela também gostava de vir para
esta praia, não para ler, apenas para… ‘sentir o mar’… Tinha tanta coisa para
lhe dizer… e não tive tempo…
Ele sorriu ao sorriso triste
dela.
Voltou a pegar-lhe na mão, mas
desta vez para a fazer sentar-se na areia, ao seu lado.
E ali, à beira mar, folhearam o
livro, esquecido e amarelecido, e leram em asas de borboleta.
E a brisa, como alma de dois anjos
quentes, envolveu-os num abraço de saudade, murmurando um imperceptível e terno
‘adeus’…